sábado, 30 de janeiro de 2016

Se eu te perco, Eu perco-me

     Sabes o quanto eu te amo. Ainda ontem estávamos sobre rodas a percorrer o caminho da felicidade e hoje encontramo-nos nus, esperando pela rotina do dia-a-dia. Imaginamos o que fora divino das nossas vidas. Aqueles raios de sol que nos percorriam o rosto, debaixo de um dia soalheiro de pleno Agosto. A minha vida estagnou. Fiquei preso nesses nossos dias de sonho. Não foi preciso gastar o dinheiro que nos restava nos bolsos. Sozinhos, fizemos o amor acontecer. Amo-te tanto. Dedicámos canções de verão, cometemos loucuras e juras de sedução. Fomos nós próprios sem que nada nem ninguém nos julgasse. Desafiámos a sorte e quem nos dissesse “Não, não!” uma, duas, três vezes ao dia. Crescemos os dois em um ano como se tivéssemos crescido no mesmo bairro uma vida inteira. Deito a cabeça na almofada a relembrar tudo isso, à noite. Aquela brisa que embatia nos nossos corpos, as braçadas na piscina, os lençóis frescos num dia abrasador. Encostámo-nos um no outro, abraçámo-nos e beijámo-nos nesses lençóis. Demos voltas e reviravoltas num clima de paixão. Agora choro. Choro porque te amo e és a única que me deixa neste estado. Revolto-me. Revolto-me porque tivemos o melhor das nossas vidas e agora não sei quando volta. Tenho imensas saudades tuas, desses momentos, dessa paixão. Não quero perder uma oportunidade de te dizer que te amo daqui à lua. Não te quero perder de todo. Se eu te perco, eu perco-me.

sábado, 21 de novembro de 2015

Qual Coração?

Sou Homem em carne humana
Montado a peças - qual coração?
Peças essas adversas à porcelana:
Sou Homem condenado à servidão!
Perdi o estímulo de ser quem era!
Sou filho da censura, pai da quimera.
Desejei fugir à minh'alma insana...
Contudo, foi fruto de minh'imaginação.

Se sinto, sofro. Se sofro é porque sinto.
A vida é reconhecer os becos sem saída.
É distinguir o sentimento mais distinto.
É também fazer crer a nossa tara perdida
E moldar o pesar em um sentimento sucinto.

Se é para ter que passar por isto
Mais vale nem sequer sentir.....
Prefiro viver na fantasia de um povo misto
Onde a Utopia reina sem ter que mentir!

sábado, 21 de março de 2015

Lisboa



Lisboa é a Menina e Moça do Paço.
É uma lenda plena de ilustres Eneias.
É das mais belas cidades europeias.
É a epopeia da vitória e do cansaço.

Lisboa é a esfinge do Tejo inacabado.
É a mártir da censura e dos cravos.
É a acusação e defesa dos escravos.
É a partida à descoberta do inesperado.

Eis, a mais leda das urbes!
A boémia da vida pombalina;
Minh'alma é dona de vida minha.

A velha cidade dos sete cumes.
A luminosa capital, cristalina.
Por ti, deixei tudo o que tinha!



domingo, 25 de janeiro de 2015

Chumbo da Adoção Homoparental


Ora, mais uma vez, a adoção por casais do mesmo sexo foi chumbada. Isto é, quem diz mais uma, diz quatro. É a quarta proposta recusada pela Assembleia da República. Dizem que à terceira é de vez, mas, desta, nem à quarta. Porquê? Quais serão os entraves apresentados pela nossa sociedade com que façam deste tema um problema a discutir quatro vezes consecutivas nas nossas bancadas partidárias?

Não se trata de uma questão partidária sequer, muito menos de simpatia por este ou aquele partido. Trata-se, sim, de uma questão social, de bem-viver que depende - por infortúnio dos casais homossexuais - da Assembleia portuguesa. Será medo de que os nossos futuros se tornem todos gays? A homossexualidade não é uma doença, não se pega. A homossexualidade não é uma opção, não se decide ser homossexual só porque os pais também o são. Portanto, qual é o drama aqui instaurado? A sociedade portuguesa necessita – com urgência – de se desenvolver e de aceitar a progressão daquilo que se fez perder ao longo de séculos. Sim, porque a homossexualidade era praticada na Antiguidade informalmente até por homens casados com mulheres. O mínimo que se podia pedir do avanço temporal era que se abolisse a homossexualidade como um passatempo extraconjugal. Contudo, o que se viu na História foi um retrocesso social que aboliu a  normalidade da homossexualidade, equiparando-a a doenças de extremo contágio e a recuperação desta prática tem demorado o triplo daquilo que demorou a ser julgada. Exemplos de líderes da Antiguidade que tinham práticas gays como Alexandre, O Grande ou o Imperador romano Nero fazem notar a discrepância entre as Eras.


É triste não deixar pessoas felizes e com condições para criar crianças melhor do que uma boa parte dos casais heterossexuais portugueses serem pais adoptivos. É triste porque muitas crianças são felizes com pouco, mas viver sem pais não se trata de muito ou pouco, trata-se de viver sem nada. Todas as crianças merecem educação, cuidados e afecto parental. Não se nasce ensinado, nem amado. Para crescer e viver é preciso amar e ser amado. 

25.01.2015

Bodas de Ouro

           


            Hoje os meus avós maternos completaram o quinquagésimo aniversário do seu casamento; as bodas de ouro. A minha família tem plena noção de que nenhum de nós terá uma relação tão forte e longa como a deles. A relação deles derruba as relações matrimoniais das filhas e as que possam vir a ter o seu filho e netos. Nos nossos dias torna-se cada vez mais complicado um casamento dar resultado durante tanto tempo. Cinquenta anos é metade de um século. Nem todas as vidas lá chegam. Um matrimónio são duas vidas em união. São cem anos de amor.

            Ainda ontem, o meu avô mostrou-me um dos pretendentes da minha avó – há bem mais de cinquenta anos atrás – quando eles ainda namoravam. O desprezo com que o meu avô falava deste era como palavras de amor eterno para com a minha avó. Haja alguém na minha vida que ame a mesma pessoa até ao fim dos seus dias! E, felizmente, essas pessoas são os meus avós. Os meus antecessores. Sangue do meu sangue. Para além de que é uma oportunidade que tenho de celebrar umas bodas de ouro de alguém que me é tão próximo. Ainda há momentos estavam os dois deitados no sofá de mãos dadas. Haverá muitos casais seniores que têm estas demonstrações de afeto como os meus avós? Os meus avós são como pais para mim. Eles criaram-me. Fizeram de mim um Homem da Terra. Tive apenas que me moldar perante a sociedade à minha maneira, mas eles estiveram sempre ao meu lado a apoiar-me.       
                                                                                                      


27.12.2014

sábado, 29 de novembro de 2014

1

         Talvez fosse fim-de-semana, talvez não. Nunca houve altura exata para transfigurar-me. O cansaço estabeleceu-se entre as minhas veias emocionais, escorrendo o meu sangue pesado e os suores frios que se expulsaram dos meus poros apertados devido à histeria do momento.
            Começo a falar como quem pede por ajuda em código inconsciente. A minha mente processa todo o meu pensamento noutra língua que nem eu próprio sei distinguir. Se a minha alma falasse durante o resto da minha vida errante como fala quando estou incorporado num demónio depressivo, eu seria incontrolavelmente um monstro; mais do que já sou. Choro as lágrimas que guardei tempos infinitos e caio, perdendo as forças que me restavam após uma descarga de energia exacerbada. Sinto o ar a suspender o meu corpo em câmara lenta para uma maior intensidade do sofrimento. Os membros ficam dormentes um a um, de modo a paralisar-me por completo; a audição diminui, deixando-me quase inapto a nível auditivo, e a visão fica, por vezes, turva. É aí que faço uma retrospetiva e revejo-me nos momentos mais cansativos desde a última vez que me encontrei nesta situação. É, então, que me visualizo a interpretar o meu próprio âmago: sou eu, enclausurado numa sala branca, como a de um hospício, sentado sob os lençóis da cama ainda por abrir. A dimensão das olheiras negras que me percorrem o rosto fazem notar que nunca cheguei sequer a dormir naquela cama. Faço movimentos bruscos com a cabeça, arrastando a minha sombra. É a agressividade da vida que me passa a correr, porém não agora que me guardo em plena paralisação. Retomo à normalidade gradualmente. Oiço a voz de minha mãe a chamar-me incessantemente. Ao encontrar-me, ajuda-me a levantar, a recuperar a respiração e a voz. Levanto-me e ando pé ante pé como se tivesse desaprendido a andar durante meses.

            Ninguém me disse que olhar para o passado iria ser fácil, muito menos me disseram que teria de o fazer assim que me sentisse abandonado. É uma forma de me fazer sobressair, sim. Porém, não aquela que eu queria que acontecesse. Voluntario-me involuntariamente a ser cobaia de uma síndrome desta magnitude, onde o físico é inteiramente dominado pelo psicológico. 

quinta-feira, 11 de setembro de 2014

As Lágrimas Que Não Derramo

               As lágrimas que não derramo são a demonstração direta da mágoa que se acumula dentro do meu âmago ensanguentado. O silêncio faz-se ouvir nos momentos de maior enclausuramento. Não há tempo para ter medo do amanhã quando o hoje ainda nem acabou. Desacreditei em tanto que, quando acredito, oiço as faíscas da pirotecnia.
            E nem o sol se esconde quando a melancolia toma conta do meu ser. Aqueles raios fortes e brilhantes penetram-me a íris ocular e a única forma de senti-los na pele é permanecer intacto sobre a dominação da luz que me enfrenta. Outra sensação perturbante é a da estar sentado na falésia à espera de um sinal. O vento que se descontrola com o movimento das ondas hostis e ferozes. As impiedosas filhas dos mares e oceanos, capazes de levar mais do que um mero corpo. Só não levam a alma nem dos mais intrépidos moribundos porque essa é imortal.
            As nuvens atravessam os céus descobertos. A luz desvanece e o azul passa a negro consoante a crescente da aurora. O caminho até casa é errante sob o escuro da noite. Os faróis dos carros são a única forma de visualizar o caminho. Até parece que na vida tudo claro e constante. Não. O amanhã está tão longe quanto o mês seguinte ou os próximos vinte anos. É inesperado. A única solução que nos resta é planear o amanhã na esperança de que seja como desejado.
            E chego ao conforto do meu lar, pensando que serei calmamente feliz. E até sou quando a réstia de ilusão ainda perdura. O ambiente anoitece, por sua vez, entre as paredes brancas. O sentimento pesaroso fortalece. As lágrimas que não derramo suportam a dor à espera que um momento de histeria que se liberte do meu corpo superficialmente massacrado.



11 de setembro de 2014